segunda-feira, 7 de março de 2011

"Conversas com quem gosta de ensinar"

 Escrevi este texto em 2005, e quando o Prof. Dr. Vilmar fez menção ao livro do Rubem Alves, na sua palestre de abertura do ano escolar, lembrei decolocá-lo no blog. Me parece atual e oportuno neste início de ano em que estamos montando uma Jornada de Formação Continuada.


No início da década de 80, quando Rubem Alves assim intitulou seu livro, no Brasil, vivíamos o auge do paradigma tecnicista que influenciava a Educação Brasileira. Na abertura do livro ele compara os educadores/professores a jequitibás e eucaliptos. Os jequitibás, árvores nativas da Serra do Mar, acostumadas a nascer e florescer espontaneamente, oferecendo sombra e alimento à fauna e flora de seu habitat. Os eucaliptos, uma espécie estrangeira, chamada “exótica” por não pertencer a nossa flora nativa, nascem enfileirados, eqüidistantes, magros e altos, prontos para o abate. São os eucaliptos, entes repetitivos plantados para gerar lucro. Na segunda parte o autor cria outra metáfora: algumas rãs que vivem no fundo de um poço, acreditam ser o poço do tamanho do mundo, então, um pintassilgo, ao descobri-las, conta-lhes que o mundo é muito mais. Mas, um grupo de rãs tomou o pintassilgo por louco, visionário, perigoso. Disseram que aquilo era ideologia “cheia de engodos alienantes” e trataram de eliminá-lo. No final do livro, citando W. Mills, o autor compara os pesquisadores e produtores do conhecimento os remadores no porão de uma galera. Eles fazem seu trabalho, com muito suor e esforço conseguem boa velocidade, mas só têm um problema: desconhecem o rumo do barco.
Quem somos nós, professores de hoje? A qual metáfora de Rubem Alves estamos respondendo ou gostaríamos de responder? Certamente não somos mais os mesmos! 20 anos se passaram! É bem verdade que naquele tempo tínhamos mais nítidos a causa e os elementos da luta e hoje...bem, as coisas estão meio difusas.
Construímos o maior sindicato da América Latina. Lutamos muito, conquistamos alguns direitos, alguma melhoria temporária no salário, mas era só por isto que lutávamos? Não, não era! Queríamos liberdade, autonomia, igualdade de direitos, democracia, um país melhor... por isso apoiamos a causa política, juntamente com nossos interesses de categoria, pois eles são sinônimos!  E caminhamos... Ah! Como caminhamos! Do Gigantinho até o Palácio Piratini; quantas vezes?
O que nos aconteceu, então, Colegas?
Viramos eucaliptos? Matamos o pintassilgo? Descobrimos que éramos apenas remadores? Não acreditamos mais na Educação como “processo pelo qual aprendemos (ensinamos) uma forma de humanidade”?
Entre vitórias e derrotas a luta nos trouxe até aqui. Não é o paraíso, mas é o resultado que fomos capazes de construir. Mesmo que esse mundo globalizado com suas guerras verdadeiras, transmitidas pela televisão nos pareça estranho e resfrie nossos ânimos por que o inimigo, camuflado, se entrincheirou mais adiante, longe do nosso alcance, nos fazendo sentir drástica impotência, não podemos desistir.
Antes de nós outros abriram a estrada e depois de nós muitos mais virão. É preciso manter aberto o caminho, o mundo, que legaremos ao futuro, precisa ser no mínimo recuperável ou de nada terá valido tanto trabalho.
Será que não temos mais coragem para ser velhos jequitibás?

Profª Neila Gonçalves Silva
Texto Publicado no Jornal Agora - abril/2005

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